segunda-feira, 28 de dezembro de 2015

o nosso surrealismo tupiniquim

foto montagem do artista visual sueco Tommy Ingberg, um surrealista contemporâneo

Em 1924 o escritor André Breton foi o principal signatário do primeiro manifesto surrealista. O termo já havia sido cunhado anos antes pelo poeta Guillaume Apolinare. O movimento teve inspiração direta nas investigações dos impulsos oníricos da psicanálise de Sigmund Freud e se estendeu para outras linguagens. Além da literatura, com Breton e Apolinare, alcançou as artes plásticas com Max Ernst, Magritte e Dalí, a fotografia, sobretudo com Man Ray, e o cinema com Buñuel.
O movimento carregava nos seus princípios, a elevação da consciência e a discussão de um novo mundo, através das representações artísticas e estas, a partir das representações do inconsciente. Havia ali, grandes pretensões mas tudo diante de um componente ético.
Muito bem, mas o que isso tem a ver com a nossa questão tupiniquim?

Como muitos termos, o "surrealismo" foi perdendo a sua conceituação original, se adequando às situações que pareciam fora da ordem, ou que estavam além do real ou algo como uma loucura excessiva. Se nos basearmos nesses novos modos de entender o "surreal", esses conceitos acobertam sem problemas semânticos o que vemos hoje no cenário político-midiático brasileiro, mas extrapolariam qualquer um dos sonhos, ou pesadelos, representados pelos artistas surrealistas.
Buñuel não conseguiria roteirizar - sem se perder pelo caminho - um enredo em que um presidente de um parlamento qualquer, envolvido em algumas das mais escandalosas evidências de corrupção, faz uma chantagem pública, escancarada, desavergonhada contra a instituição da presidência da república de um país que alcançou uma importância de relevância econômica e diplomática no cenário mundial, e a mídia, simplesmente, camufla a chantagem, tergiversa, finge que não é com ela, porque, de uma maneira insana, irascível, burra, seguiu lubrificando todos os mecanismos da fábrica da crise política que alimenta outra crise, a econômica, esta que afeta indistintamente a todos.  É como botar fogo no circo porque você não gosta do domador ( ou  domadora ) de animais, estando sentado na platéia.

A presidenta Dilma, afora os erros políticos cometidos, está há um ano na defensiva, sendo empurrada para administrar um fisiologismo que se agiganta em situações como a que vivemos, e tendo que lidar com uma crise fabricada que não lhe deu um minuto de descanso.
Um ano de um terceiro turno inconsequente que parece interminável e que os seus agentes querem levar até 2018, quando teremos novas eleições.

Tivemos um ano, portanto, surreal, quebrado agora no seu final pelo STF, que antes do seu recesso, pintou um quadro menos enigmático alterando o rito do processo do impeachment deixando a decisão para o senado, quem sabe, para depois do carnaval.

Em um cenário surreal como esse, há sempre os aproveitadores e os rescaldos da mídia são lambidos pela oposição que para tentar ganhar uma eleição que perderam, demonstraram que estavam e estão dispostos a qualquer negócio. Mas, talvez, a pior cena que vimos no ano, foi a disseminação do ódio e a abertura da porta do armário que acomodava sonolento um pesadelo. O fascismo, completamente desavergonhado, saiu do armário.

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